Educação física escolar, periódicos especializados e ditadura militar no Brasil: os boletins da federação internacional de educação física (1976-1979)
Em XIII Seminário oo CEMEF / III Encontro do gtt Memórias Da Educação Física E Esportes
Resumo
A configuração da Educação Física escolar durante a ditadura militar é um campo de investigação que tem recebido cada vez mais atenção por parte de pesquisadores que atuam não apenas na área da Educação Física, mas, também, da Educação e História (Rei, 2019). No entanto, é perceptível que, entre outras fontes e objetos, os periódicos especializados em Educação Física e esportes, a despeito de suas potencialidades, ainda carecem de investigações mais aprofundadas. O presente trabalho se debruça sobre um periódico ainda inexplorado sob o ponto de vista acadêmico: o Boletim da Federação Internacional de Educação Física (FIEP) – a mais antiga organização internacional do campo da Educação Física, fundada em Bruxelas (1923), com o objetivo fomentar o desenvolvimento das atividades físicas educativas, recreativas e de lazer, bem como o aperfeiçoamento profissional e a cooperação internacional nesse domínio (SAINT-MARTIN, 1996). Analisa, mais especificamente, as concepções de Educação Física escolar que disputavam espaço e legitimidade no interior do Boletim da FIEP, de formar a verificar em que medida essas concepções se aproximavam do modelo de Educação Física escolar propagado pela ditadura, entre 1976 e 1979, por meio da Política e do Plano Nacional de Educação Física e Desportos (POLNEFD e PLANEFD, respectivamente). O trabalho partiu do entendimento de que as edições do Boletim lançadas entre 1976 e 1979 são suportes materiais privilegiados para se deslindar “lutas de representações” (CHARTIER, 1988, p. 17) travadas a fim de se conformar práticas da Educação Física no âmbito escolar. Dentro dessa perspectiva, evitou extrair de tais edições um ou outro texto isolado, por mais representativos que parecessem ser. Ao invés disso, procurou sempre delinear um panorama circunstanciado de seus lugares de inserção, desenvolvendo – notadamente, por meio da apreciação da “materialidade” (LUCA, 2008, p. 138-139) de seus suportes – uma abordagem que fez do periódico investigado, a um só tempo, fonte e objeto de pesquisa. Face ao elevado quantitativo de artigos que defendem concepções pedagógicas antagônicas às oficiais (≅ 84,78% do total), o trabalho argumenta que, mais do que um porta-voz da ditadura, o Boletim, editado com o apoio financeiro do Departamento de Educação Física e Desportos do Ministério da Educação, foi um potencial elemento dificultador das estratégias do regime voltadas para a conformação da Educação Física escolar no Brasil (1976-1979). Procura demonstrar como é que, ao pôr em circulação concepções alternativas sobre o componente curricular, o periódico gerou, contraditoriamente, condições para que os profissionais que atuavam na área pudessem se “apropriar” (CHARTIER, 2002, p. 68), com vistas à construção de suas práticas pedagógicas, de fundamentos distintos dos contidos no modelo propagado pela ditadura por meio da POLNEFD e do PLANEFD.