Integra
Em meio as tragédias e da violência bem palpáveis das noticias de jornal, uma especial me chamou a atenção, talvez pela ligação afetiva com a beleza dessas flores, e dava conta da ameaça de sua floração em virtude das mudanças climáticas – os ipês.
Gosto de todas as suas flores- as roxas, que durante muito tempo sofreram as consequências da ênfase exagerada e comercial dos benefícios medicinais do seu chá milagroso, - as amarelas, minhas prediletas (uma vez, quando eu era apenas um garoto, uma professora substituta linda desenhou a árvore na lousa, e desde então fiquei fascinado na observação de suas floradas na natureza), - passando pelas rosas, - até chegar nas mais raras, as brancas, últimas a mostrar sua beleza.
Tendo em vista o tom vibrante de suas flores, e também por estar presente em todas as regiões do país, o ipê amarelo é considerado a árvore e a flor símbolo do Brasil, e isso foi oficializado por decreto do então presidente Jânio Quadros. O mesmo Jânio decretou, quando prefeito de São Paulo a Azaleia como a flor símbolo da cidade.
Ambas são conhecidas por floradas generosas e coloridas.
Pois a floração dos ipês e das azaleias, apesar destas últimas serem consideradas muito resistentes, ocupando jardins ensolarados, está ameaçada pelas mudanças climáticas.
Insensível, este fenômeno, de nossa responsabilidade, não se comove nem com a beleza. Os ipês nos preparam para a primavera e o caráter efêmero de suas floradas nos alertam para que a vida e a beleza sejam aproveitas em plenitude enquanto durarem, como o amor, na visão Vinicius de Morais.
Ultimamente o aparecimento das flores não coincide com o desfolhamento das árvores, o que reduz a sua beleza cênica, o período de floração vem sendo antecipado e sua duração está ficando cada vez mais curta, fatos que venho observando nos últimos anos.
E as pesquisas apontam também nesse sentido, e dão conta que as mudanças no clima têm afetado a reprodução dos ipês. Segundo elas, “o aumento da temperatura induz ao florescimento mais cedo, e nos últimos anos temos observado o adiantamento do início do florescimento em até dois meses em relação à normalidade”.
"Se as chuvas forem ficando cada vez mais curtas, ocorrendo só entre dezembro e janeiro, por exemplo, a floração pode adiantar, porque a seca vai começar muito cedo", explica a professora Rosane Collevatti, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) que vem participando de pesquisas nesse sentido.
Não é exagero dizer que para nós brasileiros, simbolicamente, a beleza dos ipês vem se equiparando ao que as cerejeiras despertam nos japoneses.
Quando chegamos à Lua, Gilberto Gil compôs e a Elis Regina cantou lindamente, como sempre, a música “Lunik 9”, que convocava poetas, seresteiros e namorados, para cantarem o que seriam as derradeiras noites de luar, ante à ameaça da presença humana no nosso satélite. A ameaça não se concretizou, pelo menos por enquanto.
Agora a mesma presença humana, desmedida, ameaça até as flores do ipê.
Talvez a crueza das catástrofes, com enchentes, derretimento de geleiras, tempestades, furações e tsunamis, soterramentos, eliminação de vidas humanas, e da fauna e flora, não seja suficiente para aflorar a conscientização do nosso papel para minimização das mudanças climáticas. Mas, a beleza das flores e sua fragilidade pode nos despertar para isso. Pelo menos é o que espero, apesar de não acreditar na valorização de bens que não sejam prontamente utilitários.
Vale a torcida, e o engajamento de todos.
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