Música e performance: análise dos efeitos agudos sobre força e resistência em musculação
Resumo
Considerada por muitos praticantes um recurso indispensável, a música pode ser uma aliada poderosa para o treinamento e atividade física, agora com evidências científicas.
Integra
Entenda o Essencial
- O estudo investigou como a música (preferida, não preferida e ausência) afeta a força máxima, a resistência de força e o estado de humor em mulheres que treinam musculação.
- Os testes envolveram os exercícios supino reto e extensão de joelhos, com cargas de 60% e 85% de 1RME (uma repetição máxima estimada).
- Não foram encontradas diferenças significativas na força de resistência, nem no estado de humor entre as diferentes condições musicais.
Introdução
A música é uma constante na vida de muitas pessoas, presente em momentos de lazer, celebração e, cada vez mais, nos ambientes fitness. Na academia ou na rua, os fones de ouvido fazem parte do equipamento esportivo. Em aulas coletivas, como os treinos de crossfit ou ciclismo indoor, a trilha sonora adota pelo professor é um diferencial.
Mas será que a música tem um efeito real sobre a performance, ou é apenas uma distração agradável? Para proporcionar uma resposta científica à questão, uma pesquisa investigou os efeitos agudos da música na força, resistência e humor de mulheres praticantes de musculação.
Como foi feito o estudo
O estudo “Efeitos agudos da música sobre a força máxima, a força de resistência e o estado de humor em mulheres praticantes de musculação” de Medeiros e colaboradores teve como objetivo verificar o efeito agudo da música sobre força máxima, a resistência de força e o estado de humor. Para isso, utilizou-se de um delineamento experimental, com diferente exercícios e condições musicais.
A intervenção envolveu nove mulheres praticantes regulares de musculação em uma academia em Xanxerê, Santa Catarina, Brasil. Cabe ressaltar que este enfoque se deve ao fato de que nos estudos anteriores sobre música e performance não foi evidenciada a participação feminina.
As participantes foram divididas em três subgrupos e passaram por quatro momentos de avaliação, ao longo de quatro semanas. Em cada momento, elas foram expostas a uma condição musical diferente: músicas preferidas, músicas não preferidas e ausência de música.
Antes dos testes, as participantes responderam a questionários (IPAQ, PAR-Q e anamnese) para avaliar seu nível de atividade física, aptidão para o exercício e preferências musicais. A carga para os testes de força máxima foi estimada utilizando a fórmula de Baechle et al. (1994).
Os testes consistiram em realizar o máximo de repetições possíveis nos exercícios supino reto e extensão de joelhos, com cargas de aproximadamente 60% (para resistência) e 85% (para força máxima) de 1RME. O estado de humor foi avaliado antes e depois dos testes utilizando a Escala de Humor de Brunel (BRUMS).
As participantes receberam somente a instrução de realizar o maior número de repetições possíveis , sem que nenhum outro estímulo externo fosse providenciado.
E o que o estudo diz?
Os resultados mostraram que a música teve um efeito ergogênico (ou seja, de melhora de desempenho) na força máxima apenas no exercício de extensão de joelhos. As participantes conseguiram realizar mais repetições com 85% de 1RME quando ouviam suas músicas preferidas, em comparação com quando ouviam músicas que não gostavam.
No entanto, não houve diferença significativa na força de resistência (com 60% de 1RME) em nenhum dos exercícios, nem entre as diferentes condições musicais.
Da mesma forma, o estado de humor não apresentou mudanças significativas entre os momentos de avaliação, em nenhuma das condições.
Relação com outros estudos
Os achados deste estudo corroboram parcialmente a literatura existente. Uma meta-análise abrangente realizada em 2020, que compilou dados de 139 estudos, foi realizada para medir os efeitos de ouvir música durante a prática de exercícios e esportes em termos de respostas psicológicas, fisiológicas, psicofísicas e resultados de desempenho, com base em dados de 3.599 participantes (Terry et al., 2020).
Os resultados revelaram que a música está associada a efeitos benéficos significativos em relação ao estado emocional (tornando-o mais positivo), ao desempenho físico (melhorando-o), à percepção de esforço (reduzindo-a) e ao consumo de oxigênio (otimizando-o).
Já os efeitos no desempenho foram influenciados pelo tipo de atividade (exercício apresentou resultados mais expressivos do que esporte) e pelo andamento da música (músicas rápidas demonstraram maior impacto do que músicas lentas ou moderadas).
Em síntese, os resultados apoiam o uso da música em diversas atividades físicas como uma forma de promover um estado emocional mais positivo, melhorar o desempenho físico (efeito ergogênico), reduzir a sensação de esforço e aumentar a eficiência fisiológica.
Por outro lado, a ausência de efeito na força de resistência e no estado de humor contrasta com alguns estudos que relatam benefícios da música nessas variáveis. Essa discrepância pode ser explicada por diferenças metodológicas, como o tipo de exercício, a intensidade, a população estudada e a seleção musical.
Diretrizes profissionais
Com base nos achados deste estudo e na literatura relacionada, algumas diretrizes podem ser sugeridas para profissionais de Educação Física:
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Música como ferramenta útil para aumentar a motivação e, potencialmente, melhorar o desempenho em exercícios de força máxima.
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Personalização, sendo que permitir que os alunos escolham suas músicas preferidas pode ser mais eficaz do que impor uma playlist genérica.
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Monitoramento, no sentido de que é preciso avaliar a resposta do aluno e garantir que ela não esteja mascarando sinais de fadiga excessiva ou desconforto.
Considerações
O estudo analisado contribuiu para a compreensão dos efeitos da música no treinamento de força, mostrando que a música preferida pode ter um efeito ergogênico na força máxima em um exercício específico. No entanto, é importante ressaltar as limitações da pesquisa, como o tamanho pequeno da amostra e a falta de controle sobre algumas variáveis (sono, alimentação, etc.).
Apesar dessas limitações, o estudo destacou a importância de considerar a música como um fator que pode influenciar o desempenho e a experiência do aluno na prática de exercícios físicos. Profissionais de Educação Física devem estar atentos a essa influência e utilizar a música de forma consciente e estratégica.
No universo da pesquisa
Para aprofundar o conhecimento sobre os efeitos da música no treinamento de força, algumas sugestões de pesquisas futuras incluem:
- Ampliar a amostra, realizando estudos com um número maior de participantes e maior diversidade (idade, nível de treinamento, etc.).
- Comparar diferentes gêneros musicais, assim como características da música (ritmo, andamento, letra) no desempenho e no estado de humor.
- Estudos qualitativos, a fim de compreender a experiência subjetiva dos participantes com a música durante o exercício.
Referências bibliográfica
MEDEIROS, J. C. L. et al. Efeitos agudos da música sobre a força máxima, a força de resistência e o estado de humor em mulheres praticantes de musculação. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v. 36, e36182684, 2022. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rbefe/article/view/182684… Acesso em: 18 fev. 2025.
Terry, P. C. et al. Effects of music in exercise and sport: A meta-analytic review. Psychological Bulletin, v. 46, n. 2, p. 91–117, 2020. Disponível em: https://doi.org/10.1037/bul0000216